Pertencimento e colaboração no empreendedorismo capixaba

Artigo 10 de Mar de 2022

Por Rafael Miranda*

[ORIGEM] 1. ponto inicial de uma ação ou coisa que tem continuidade no tempo e/ou no espaço; ponto de partida; procedência. 2. local de nascimento; naturalidade; nacionalidade.

Ao contrário do que hoje se vê por restaurantes, bares e outros estabelecimentos de todo o Espírito Santo, há 13 anos, não era comum ver por aí nenhum capixaba usando produtos regionais - muito menos de forma orgulhosa, levando uma gíria, uma cidade ou um ponto turístico estampado no peito. Na verdade, até se via, mas de outros estados, como Rio de Janeiro, São Paulo e Bahia.

O início: como tudo começou?

O ano era 2009. Em uma caminhada cotidiana na Praia de Camburi, avistei um rapaz vestindo uma camisa com a frase “Copacabana Soul”. Na mesma semana, fui a um restaurante em Santa Teresa e me deparei com a estampa “Ipanema Beach”. Nada contra o Rio de Janeiro ou qualquer outro lugar, mas, com tantas riquezas e belezas capixabas, por que víamos tantas pessoas exaltando apenas outros estados?

De uma forma um tanto quanto resumida, esse foi o ponto de partida para a construção da Origens, a primeira marca do ramo de vestuário e moda 100% capixaba. Mais que isso: orgulhosamente capixaba. Na época, eu acabava de voltar de dois intercâmbios – em San Francisco e Las Vegas, ambos nos Estados Unidos – e me recordei de uma passagem por Breckenridge, no Colorado, em que os negócios locais eram literalmente os protagonistas da cidade.

Em meio a essa inquietude, um trabalho no último ano da faculdade me desafiou a construir um plano de negócios para uma empresa. Ao contar a minha sede em empreender e essa experiência no exterior para Igor Sousa, que acabou virando meu sócio, ele se identificou e decidimos construir essa história juntos. A gente não tinha conhecimento de modelagem e muito menos do mercado de vestuário. Não foi uma tarefa fácil começar do zero, mas não faltava disposição e força de vontade.

Desafios e a importância do pertencimento

Iniciamos a produção com 300 peças, fruto de um capital bem restrito. Com um intenso trabalho de divulgação - o famoso “boca a boca” -, conseguimos entrar em lojas multimarcas na Grande Vitória e em Linhares. Quando o depósito, que era no meu próprio quarto, ficou pequeno, migramos para um QG de 19 m², que era onde a gente criava as estampas e fazia todo o trabalho de vendas, financeiro e comercial.

Em dois anos, tivemos um crescimento exponencial: inauguramos lojas próprias no ES e chegamos em 16 estados, tendo uma cartela de mais de 350 lojas multimarcas que vendiam a nossa marca. Entre 2014 e 2015, surge o nosso primeiro desafio: a crise financeira macroeconômica que atingiu a todo o país. Até então, a gente viajava em “céu de brigadeiro” e, a partir daí, precisamos nos reinventar.

Falaremos melhor sobre esses episódios desafiantes – e como os superamos – em uma outra oportunidade. Mas, vale citar um outro momento marcante: a crise de segurança do Espírito Santo, em 2017, que foi uma grande virada de chave em nossa história. Logo no primeiro dia, a nossa loja foi assaltada. Quebraram o vidro e levaram praticamente todo o nosso estoque, além de itens como televisão e computador.

Fizemos uma publicação nas redes sociais, informando o fechamento provisório da loja por conta do ocorrido e, por lá, iniciou-se uma movimentação por parte do nosso público: recebemos ajuda de moradores próximos - que se ofereceram para ajudar a limpar a fachada e colocar tapumes, por exemplo - e pedidos de uma coleção sobre o tema, que posteriormente virou a campanha “Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”, que teve parte do seu lucro revertido para uma campanha de apoio a lojistas da CDL Vitória.

O aprendizado? Sem dúvidas, a importância do pertencimento. De fazer parte, estar perto.

Planos para o futuro

Atualmente, colecionamos 7 lojas próprias no Espírito Santo, além de um e-commerce que atende a todo país, inclusive com coleções de outros seis estados, pois acreditamos na valorização da diversidade cultural do nosso país. Afinal, cada local tem a sua origem própria – e isso deve ser respeitado.

Mas, para um futuro próximo, estamos trabalhando com a expansão da marca para outros estados, escalando o modelo feito aqui em solo capixaba em outras regiões. Além disso, buscaremos ainda mais autoridade local no ES e nos outros estados por meio de um projeto, que se chamará Estúdio Origens, onde faremos coleções de forma colaborativa com artistas locais, valorizando e fomentando o artista de cada região.

Empreendedorismo colaborativo

A trajetória da Origens chegou com uma estratégia de consolidação que ainda é mantida até hoje. Ela foi responsável pela conquista do mercado local e serviu de benchmark para outras marcas locais que surgiram depois, funcionando como uma espécie de empreendedorismo colaborativo.

Na prática, colecionamos parcerias com marcas, institutos e empresas capixabas de diversos segmentos, citando alguns deles: a primeira loja de roupas localizada no calçadão da principal orla da capital, no térreo do Barlavento; uma parceria com o Instituto Líderes do Amanhã; e a criação de uniformes mais “descolados” para os colaboradores da Wine, que, além de capixaba, é o maior clube de assinatura de vinhos do mundo.

Assim como me inspirei – e tive a honra de me tornar amigo de vários desses atores do ecossistema de empreendedorismo capixaba, como Rogério Salume (Wine), Alexandre Soares (LiftBank), Marcus Buaiz (Spark), Rodrigo Miranda (Zaitt) e Aridelmo Teixeira (Fucape) -, aproveito para deixar alguns ensinamentos para quem já está ou quer entrar para esse mundo tão promissor no ES.

1. Se prepare: antes de tudo, é necessário ter um conhecimento mínimo de gestão e fazer um estudo de mercado. Coisas não planejadas – ou pouco estudadas - podem levar a problemas desnecessários, que poderiam ser evitados. Aqui na Origens, particularmente, iniciamos criando um plano de negócios, ou seja, entendemos o mercado local e se aquela “dor” realmente existia entre os capixabas. E isso, sem dúvidas, fez toda a diferença em nossa história!

2. Acredite: um dos mais importantes passos é o poder de acreditar. Mas, para isso, é preciso de um autoconvencimento, ou seja, você precisa ser o primeiro a acreditar no seu negócio. Eu costumo dizer que empreender é acreditar sempre, ainda que em tempos de crise ou quando os obstáculos parecem intransponíveis. No entanto, esse “acreditar” só vem após você se submeter a um questionamento de todas as possíveis falhas e todas as análises dos cenários de mercado. Dessa forma, quando você for contar do seu sonho ou seu negócio para outras pessoas (adiantando, este é o nosso próximo passo!), o seu brilho nos olhos é quem vai falar por você e convencer!

3. Compartilhe: a história da Origens é fruto de um compartilhamento de ideias. Desde sempre, buscamos sair do óbvio, criar relações em segmentos diferentes e fazer trabalhos em conjunto. Isso une públicos, une ideias e acrescenta – para todos os lados. Muitas ideias que saíram do papel vieram de conversas com grandes empresários, assim como diversas outras vieram de uma mesa de bar ou um almoço de domingo em família. É sobre ouvir, unir e compartilhar.

4. Execute: é hora de tirar os planos do papel e colocar em prática! Ouvi de um amigo que “nada resiste ao trabalho” e é nisso que acreditamos por aqui. A cada pancada (e acredite, elas virão!), você voltará ainda mais forte. A jornada oscila, você pode - e deve - se reinventar nesse processo, mas é exatamente essa oscilação que produzirá um grande enredo para você construir uma grande marca.

* Capixaba, fundador e diretor estratégico da Origens

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