Carta do Economista: menor crescimento e maior inflação dominam o cenário internacional

Análise 4 de Out de 2021

O mês de setembro reforçou o cenário que vinha despontando ao final de agosto. As maiores economias do mundo como China, Estados Unidos e Europa mostram queda da taxa de crescimento, enquanto a inflação continua se mostrando alta e/ou em elevação.

Neste cenário, vários bancos centrais começaram a sinalizar a redução dos estímulos monetários. O Federal Reserve (Fed) em sua reunião de setembro afirmou que a recuperação da economia avançou e que deve ser anunciado em breve a redução das compras de ativos (“tapering”). Além disto, a inflação elevada tem gerado expectativa de que a elevação de juros deve ser iniciada já em 2022, afetando o retorno dos títulos públicos.

No Brasil, os dados apontam crescimento e inflação em alta. Mas, reduzida a tensão entre o Executivo e o Judiciário, os maiores foco de incerteza continuam sendo as pressões por mais gastos, e as reformas que têm tentado elevar os impostos e manter os privilégios no setor público.

Este ambiente de inflação, menor crescimento e expectativa de redução dos estímulos monetários levou ao aumento dos retornos dos títulos americanos e a uma forte realização dos mercados acionários internacionais. No Brasil, além do cenário externo, adicione a incerteza com as reformas para gerar uma queda ainda mais forte no Ibovespa.

Mercado Externo

Os dados liberados em setembro mostram queda do crescimento nas maiores regiões econômicas, China, Europa e EUA. Além disso, a inflação elevada e/ou em elevação continua sendo um fator de incerteza sobre o início do “tapering” e do aumento dos juros.

Comecemos com a Europa. Na Zona do Euro, os Índice dos Gerentes de Compras (PMI em inglês) de manufaturas e serviços de setembro tiveram quedas passando de 61,4 para 58,7 e de 59 para 56,1, respectivamente (ver Gráfico I).

No Reino Unido, os PMI de manufaturas e de serviços também tiveram queda em setembro. O de manufaturas passou de 60,3 para 56,3 e o de serviços de 55 para 54.6. Ainda, as vendas no varejo caíram.

Na China, as vendas no varejo e a produção industrial em agosto tiveram alta de 2,5% e 5,3%, mas vieram bem abaixo do esperado (7% e 5,8%). O PMI de manufaturas de setembro caiu, passando de 50,1 para 49,6, mas o de serviços subiu indo de 47,5 para 53,2 (a crise de crédito da Evergrande, até o momento, não teve maiores consequências).

Nos EUA a economia também perdeu ritmo, embora continue crescendo. Foram criadas 10,9 milhões de vagas de emprego em agosto. Mas, os PMI de setembro de manufaturas e serviços tiveram quedas, passando de 61,1 para 60,5 e de 55,1 para 54,4, respectivamente.

A alta da inflação para o consumidor e para os produtores em todas as maiores economias, continua gerando instabilidade, pressionando os bancos centrais.  Os preços para o produtor (PPI em inglês) subiram forte em agosto: China (9,7%), Zona do Euro (12,1%) e EUA (8,3%). Já os preços para os consumidores (CPI), embora mais baixos, continuam acima da meta no Reino Unido (3,2%), nos EUA (5,3%) e na Zona do Euro (3,4%).

Com a elevada inflação nos EUA e a recuperação da economia, o Fed, em sua reunião de setembro, reconhece a forte recuperação e notifica que o “tapering” deverá ser anunciado em breve. Além disto, o SEP (“Summary of Economic Projections”) mostra que o aumento dos juros já deve acontecer em 2022, gerando elevação dos retornos dos “treasuries”.

Por fim, vale notar que o teto da dívida do governo americano, voltou a partir do dia primeiro de agosto (01/08). Mas, existe um impasse no Congresso para aumentar este teto. Se o Congresso não votar a tempo, podemos ter novo “downgrade” da dívida americana, com seus esperados impactos.

Mercado Interno

Como sempre fazemos, vamos começar listando as expectativas do Boletim Focus e os dados econômicos. O crescimento esperado para 2021 teve pequena queda e está em 5,04% (há um mês era de 5,22%). Já a inflação esperada continua em alta. Era de 7,27% no fim de agosto e está em 8.45% no fim de setembro. Já a Selic esperada para dezembro de 2021 subiu de 7,5% em fins de agosto para 8,25% em fins de setembro.

Os dados liberados continuam mostrando a economia brasileira em crescimento, a despeito da queda de 0,1% do PIB no segundo trimestre de 2021 que foi puxada pela performance da agricultura (ver Gráfico II).

Mas, o ritmo de crescimento dá sinais de queda. Assim, a produção industrial de julho teve queda de 1,3%, mas as vendas no varejo tiveram alta de 1,2% e o IBC-Br de agosto subiu 0,6%.

Finalmente, segundo o CAGED (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) a economia brasileira criou 372,3 mil empregos em agosto.

Devemos mencionar mais alguns acontecimentos do mês. Primeiro, com a inflação alta e em elevação, o Banco Central do Brasil (BCB) elevou a Selic em 1,0 ponto percentual em sua reunião de setembro, sinalizando novo aumento (de 1 p.p) na próxima reunião. Segundo, a reforma tributária e a reforma administrativa estão indo na direção oposta. A reforma tributária trazendo aumento de impostos e a reforma administrativa mantendo privilégios, sem gerar redução de gastos. Finalmente, a pressão pelo aumento de gastos pelo governo e/ou Congresso continuam.

Como sempre ressaltamos, as perspectivas da economia e dos preços dos ativos em 2021 dependem de: (i) da vacinação e contenção da pandemia; (ii) manutenção da estabilidade política interna; (iii) avanço das reformas, reduzindo o risco fiscal e inflacionário.

Quanto ao item (i), vemos avanço na vacinação e queda do número de novos casos. Quanto ao item (ii), os conflitos entre Executivo e Judiciário foram contidos. Mas, em breve, as eleições podem trazer mais instabilidade. Quanto ao item (iii), as reformas macro continuam não agradando: a reforma tributária aumenta a carga de impostos e a reforma administrativa não gera queda de gastos e mantem privilégios.  Neste cenário de queda de crescimento, a falta de reformas aumenta o risco fiscal e inflacionário devendo levar a maior volatilidade.

Renda Fixa: EUA

O aumento dos retornos dos títulos do governo dos EUA começou em agosto de 2020 devido a vários fatores: controle da pandemia, recuperação da economia e a vacinação (Gráfico III).

No início de 2021, o aumento dos retornos tem novo impulso devido ao aumento da inflação nos EUA. Mas, estes aumentos foram estabilizados pela postura do Fed, sinalizando não ver razões para iniciar o “tapering”.

Mas, a partir de setembro, três novos fatos mudaram este cenário. Primeiro, o comunicado do Fed de que deve iniciar o “tapering” em breve. Segundo, os dados indicando que a maior parte dos membros do FOMC querem aumento dos juros já para 2022. Com isto, e com a inflação elevada, os retornos dos títulos tiveram forte e rápida elevação, que tende a continuar. Terceiro, o impasse no Congresso para aumentar o teto da dívida.

Nos próximos meses, dois fatores devem afetar os retornos. O primeiro é a implementação do “tapering” e do aumento dos juros. O segundo fator, é o teto para o endividamento do governo dos EUA. Se o Congresso não suspender ou aumentar o teto, a possibilidade do fechamento parcial do governo, atraso do pagamento dos serviços e um novo “downgrade” da dívida podem gerar mais instabilidade e novo aumento dos retornos.

Renda fixa: Brasil

Os retornos dos títulos públicos brasileiros sobem desde agosto de 2020, com o aumento do risco fiscal, do risco inflacionário e da instabilidade política interna (além da elevação e dos retornos dos títulos do governo americano).

A elevação do crescimento econômico, o avanço da vacinação e a queda dos retornos dos “treasuries” permitiu a estabilização dos retornos, durante o segundo trimestre de 2021. Mas, a partir de julho, a pressão por aumento dos gastos, a limitação das reformas discutidas no Congresso e o aumento da carga tributária propostas tem elevado os riscos internos e reduzido o crescimento. A consequência tem sido um novo aumento dos retornos (Gráfico IV).

A perspectiva para os retornos dos títulos continua dependendo: (i) do avanço da vacinação e do crescimento; (ii) da estabilidade política; (iii) do avanço das reformas, reduzindo o risco fiscal e inflacionário; (iv) do “tapering” e do retorno dos títulos americanos.

Sintetizando, quanto maior a instabilidade política, o risco fiscal e inflacionário, maiores devem ser os retornos dos títulos públicos. O início do “tapering” nos EUA deve aumentar ainda mais os retornos.

Renda Variável/Ações: Estados Unidos

Com a queda dos retornos dos “treasuries” a partir de março de 2021, as bolsas americanas recuperaram a tendência de alta e voltaram a bater novos recordes de pontuação. Mas, o comunicado do Fed em setembro sobre o início do “tapering” e a possibilidade de subir os juros já em 2022 inverteram esta tendência (Gráfico V).

O início próximo da implementação do “tapering”, num ambiente de elevada inflação, deve continuar a afetar negativamente o valor das empresas, ao aumentar os retornos dos “treasuries”, realocando investimentos para a renda fixa.

Quanto maior o crescimento e a inflação, maior tende a ser o retorno dos "treasuries".

Finalmente, o impasse no Congresso dos EUA para reajustar o teto do endividamento, adiciona um novo fator de incerteza, podendo gerar novo “downgrade” da dívida dos EUA (como ocorreu a 10 anos atrás) e acelerar ainda mais a alta dos retornos.

Renda Variável/Ações: Brasil

No segundo trimestre de 2021, a recuperação da economia, a estabilidade política e o avanço na vacinação, permitiram que o Ibovespa retomasse a valorização e voltasse a bater novos recordes (Gráfico VI).

A mudança de cenário em meados de junho, inverte esta tendência (Gráfico VI). Entre as razões, estão os conflitos entre os poderes e as limitações das reformas com aumento da carga tributária e constante ameaça de aumento dos gastos públicos.

Em síntese, embora a economia esteja crescendo, o ambiente interno domina, levando a queda do valor das empresas brasileiras, com o descolamento do mercado doméstico do internacional.

Finalmente, em setembro, ao ambiente interno juntou-se o ambiente externo, acelerando ainda mais a queda do valor das empresas.

As perspectivas do mercado acionário do Brasil dependem: (i) da recuperação/vacinação; (ii) da estabilidade política; (iii) do avanço das reformas que reduzam o risco fiscal e inflacionário e melhorem o ambiente de negócios; (iv) do cenário externo.

Mantido o cenário doméstico atual, o aumento dos retornos dos títulos dos EUA (com o “tapering” e o aumento dos juros pelo Fed) deve puxar ainda mais os juros domésticos e gerar realocação dos investimentos para a renda fixa. Neste caso, a valorização das empresas deve ter impacto negativo ainda maior. Já um possível “downgrade” da dívida americana deve exacerbar ainda mais este cenário.

Autor

Arilton Teixeira, Economista-chefe da Apex Partners

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